sábado, 22 de agosto de 2015

Eleição? Predestinação?


Alguns meses atrás eu estava debatendo com algumas pessoas sobre teologia, e um jovem se levantou e começou a fazer uma leitura do livro de Romanos e então me perguntou: “O seu Deus é grande o suficiente para predestinar algumas pessoas ao inferno por causa da ira divina? ”
Algo assim. Foi tão estranho quanto parece. Eu vou te dizer como respondi depois, mas parte de mim considerou perguntar: “Então, que escola bíblica você frequenta? “
Porque, normalmente, pessoas muito religiosas fazem perguntas como essa. Sobre quem é eleito, quem não é, quem está predestinado, quem está dentro ou fora.
Mas, ok. Por que essas palavras, aparentemente, exclusivistas são usadas? Qual foi a real intenção? Essas duas palavras foram usadas na bíblia com um propósito tão bom quanto Deus o é.
Eu poderia escrever vários pontos sobre isso, falando sobre poucos X muitos, graça, justiça, juízo, soberania e outros atributos de Deus. Afinal, Deus é poderoso e precisa ostentar seu poder, não é? Mas não vou fazer isso, pelos menos, não hoje. Vou me ater às duas palavras centrais da questão: Eleição e predestinação. Vamos limpar o terreno.
Em primeiro lugar, eleição. Nas escrituras, a eleição é sempre instrumental. O que quero dizer com instrumental? Pense em como usamos a palavra eleição: Pessoas votam em alguém para executar determinada tarefa (Presidente, Líder de classe, etc) por meio de uma eleição. A pessoa que ganha, o eleito, é eleito para fazer essa tarefa em particular. As pessoas não são eleitas apenas para serem eleitas, a eleição é para o propósito de fazer alguma coisa.
Agora, vamos pensar sobre isso em relação à Bíblia. O que a Bíblia diz sobre? Trata-se de uma tribo de pessoas que têm essa sensação de que são chamados para ser uma tribo diferente das outras, contrária às outras. Naquela época, as tribos existiam com o propósito de servirem a si mesmas, para acumular e formar alianças para autopreservação. Mas esta tribo, esta tribo começa com a história sobre um homem chamado Abrão, para o qual Deus falou que o mundo inteiro seria abençoado através dele (E não, na bíblia não existe graça salvífica e não salvífica, ou amor salvífico e não salvífico. Graça é graça, amor é amor, e o choro é livre). Esta tribo acredita que eles têm uma vocação que se estende para muito além de si mesmos. Para os confins da terra. Eles são uma tribo que existe não apenas para o seu próprio bem-estar, mas para o bem-estar de todas as outras tribos.
Você consegue ver como eles usaram a palavra eleição? A palavra está organicamente ligada com missão, propósito, vocação, ação em nome de terceiros, e para o bem-estar de terceiros.
Eles estavam sempre sendo fiéis a esse senso de eleição?
Não. E é isso que você vê nos evangelhos repetidamente e insistentemente: Jesus chamando sua tribo de volta as suas origens, a sua missão, a sua responsabilidade divina de ser luz para todo o mundo.
Em segundo lugar, predestinação. A palavra aparece 6 vezes na Bíblia. Que em grego é proorizo, que tem origem em duas outras palavras gregas. A palavra pro que significa antes, e horizo, que é de onde pegamos a palavra horizonte, também significando fronteiras, ou demarcação. Vamos para um versículo em Efésios 1, onde ela é usada:
“Em amor nos predestinou para sermos adotados como filhos por meio de Jesus Cristo, conforme o bom propósito da sua vontade, para o louvor da sua gloriosa graça, a qual nos deu gratuitamente no Amado...
Uma observação: O contexto é adoção.
Você já esteve em um aeroporto e havia uma multidão de pessoas à espera no portão porque um membro da família, ou amigo, foi para fora para adotar uma criança e agora ele está prestes a desembarcar, e todos os amigos e parentes se reúnem para dar as boas-vindas à família e ao seu novo filho? Eles estão segurando plaquinhas escrito “Bem-vindo”, ou usando camisas personalizadas (como se o bebê pudesse ler). Tem sempre um amigo filmando. E então o avião pousa, e todos ficam na expectativa de eles aparecerem no corredor. E quando aparece, tem toda a vibração do momento, alegria, abraços e celebração.
Adoção. Esse é o contexto do versículo.
“De acordo com o bom propósito da sua vontade...”
É o que Deus faz nesse verso. Ou seja, adotar muitas crianças é o prazer de Deus. Deus é um buscador de prazeres, e o que traz um prazer imensurável a Ele é acolher pessoas, tornando-as parte da família, fazendo filhos.
“Para o louvor da sua gloriosa graça, a qual nos deu gratuitamente no Amado...”
Paulo quer que entendamos o propósito de Cristo, que é mostrar-nos o amor que nos Deus deu livremente, expresso especificamente no amor que Deus tinha por Jesus.
Agora, uma ilustração. Vamos dizer que sua amiga da faculdade Ana trabalha em uma cidade longe de onde você mora, e vocês não se veem desde que se formaram. Mas um dia você descobre que precisa ir naquela cidade por negócios, ou para resolver algo importante. Você liga para Ana e sugere um encontro, para conversar, se divertir, se lembrar dos tempos de faculdade. Daí, você manda o endereço do hotel em que vai ficar e ela diz que trabalha na mesma rua, por que não encontrá-la no trabalho? O dia chega e você aparece no endereço que ela te deu...
Um pouco sobre Ana: Ela sempre foi organizada. Completamente. Como ninguém. Prateleiras bem organizadas, secretaria impecável, roupas devidamente ajeitadas.
Então, você anda em direção à porta e Ana está com uma mulher diante de uma mesa, sentadas, mostrando um papel, e elas parecem estar tendo uma conversa profunda, a mulher está ouvindo atentamente o que Ana tem a dizer. Ela te vê e pede dois minutinhos, e você se senta e espera, observando-a. Seja o que for, a mulher com a qual Ana está falando está absorvendo cada palavra, e ao fim, ela dá um abraço, se despede e diz que não sabia o que faria se não fosse pela ajuda de Ana.
Em seguida, você a abraça e a cumprimenta. E então, pergunta o que estava morrendo de vontade de perguntar:
“Ana, o que você faz? ”
Ela, então, explica que depois da faculdade fez um mestrado, pós-graduação em trabalho social, e depois foi contratada pelos serviços sociais da cidade. Mas, ao longo do tempo, ela percebeu que a maioria das pessoas com quem ela interagia realmente precisava de ajuda para organizar suas vidas, criar orçamentos, priorizar necessidades, etc. E então, ela percebeu que poderia ajudá-las nisso. E encontrou um lugar no qual ela poderia trabalhar diretamente nesse aspecto.
Você está tão inspirado com essa história que Ana está contando, e você lembra de como ela era na faculdade, e lembra do rosto da mulher que ela estava ajudando, e diz:
“Ana, parece que você estava predestinada a fazer isso...”
Agora, vamos à palavra que você acabou de dizer, porque ela tem um forte significado. Você está impressionado com como o jeito de Ana mostrava que ela seria assim. Que não é um acidente. Que Ana e os tipos de habilidades que ela tem, e o trabalho que ela está fazendo não são aleatórios ou inúteis. Mas de alguma forma muito difícil de descrever mostra como o universo funciona.
Ufa.
Tudo o que Ana era e mostrava ser, levava-a a este exato momento. Dá profundidade ao que ela está fazendo no presente. Você coloca o trabalho dela no contexto de toda sua vida, nomeando a trajetória que viu em primeiros vislumbres na faculdade, mas agora vê em sua plenitude, e é lindo.
É assim que os primeiros cristãos estavam tentando explicar essa nova coisa extraordinária que estava acontecendo no coração das pessoas. Algo diferente e novo. Mas que estava sendo cultivado neles anteriormente. Algo que antes era visto apenas como primeiros vislumbres, mas agora é pleno e lindo. Algo como viver através do Cristo ressuscitado. Você consegue ver como eles usaram essa linguagem e como ela implica em um sentido de intenção e propósito desde os tempos anteriores?
Tudo que eu disse até aqui foi para chegar à seguinte conclusão:
As pessoas frequentemente usam essas palavras para limitar as ações de Deus, mas na Bíblia elas são usadas para expandir nossa compreensão do que Deus está fazendo.
O Deus que dá livremente, que nos chama de filho pois isso o traz prazer. Pessoas que têm esse senso de eleição, e por isso carregam essa responsabilidade e esse chamado de viver em prol de outros. Essas palavras são frequentemente e conscientemente usadas com o objetivo de mostrar o desejo expansivo, e não introverso, de Deus de resgatar, redimir e restaurar tudo e todos.
(By the way, se alguém usa Romanos 9-11 ao discutir sobre se uns são predestinados e outros não, deveria ver no fim da seção, em 11:25 que diz que todo o Israel deverá ser salvo.
Todo. O. Israel. Deverá. Ser. Salvo.
Se a passagem é sobre um Deus que escolhe ao seu bel prazer quem deve ou não ser salvo, por que no final das contas todos deverão ser? Booom).
Ah, e aquele cara que se levantou e fez aquela pergunta?
A minha resposta foi:
Não.


2 comentários:

  1. Seu texto é ótimo!
    Conheça meu blog http://modadeneve.blogspot.com.br/2015/08/ola-youtube.html
    Beijos

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